Ciclos da vida potencializam a espera, os encontros e as despedidas, não necessariamente nessa ordem.
Espera de mudança, de continuidade. Esperança.
Encontros casuais, marcados, cancelados; conectados ou desconexos.
Despedidas pela conclusão, pela impossibilidade. Rompimentos favoráveis ou nem tanto. Alguns com muito sofrimento.
Milton Nascimento canta: “a hora do encontro é também, despedida”. Inevitavelmente. Ficamos juntos para podermos nos separar e nos separamos para podermos ficar juntos, de nós mesmos, dos outros. A ausência desse movimento – sempre junto, sempre separado – é patológica.
Entre os encontros, a espera. O tempo da angústia e da criação. O tempo do fio que tece ou dá nó.
Alimento-me das ilustrações de Serge Bloch e das palavras de Davide Cali, que aqui reproduzo, do tão profundamente belo e tocante livro Fico à espera… (Cosac Naify, 2007).
Fico à espera
… de crescer
… de um beijinho antes de dormir
…de que o bolo esteja pronto
… de que a chuva pare
… de que o Natal chegue
Fico à espera
… do amor
… do começo do filme
… de reencontrá-la
Fico à espera
… da partida do trem
… do fim da guerra
… de que ela diga sim
Fico à espera
… de um bebê
… de saber se é menino ou menina
… de que as crianças cresçam
… das férias
… de que o outro peça desculpas
Fico à espera
… de que os filhos telefonem
… de que o médico diga: “Não é nada”.
… de que ela não sofra mais
…
… de que a primavera volte
Fico à espera
… de que alguém bata à porta
… de que meus filhos me visitem
… de que, em breve, a família cresça.
A partir dessas palavras, teço as minhas, em O encontro e a despedida:
O encontro com a força. A despedida do frágil.
O encontro com a segurança. A despedida do medo.
O encontro com o sabor. A despedida da fome.
O encontro com a clausura. A despedida da liberdade.
O encontro com o novo ano. A despedida de mais um ano.
O encontro com o amor. A despedida da solidão.
O encontro com o começo. A despedida do fim.
O encontro. A despedida.
O encontro com o fim. A despedida do começo.
O encontro com a dor. A despedida da paz.
O encontro com a notícia. A despedida do sem saber.
O encontro com o sim. A despedida do não.
O encontro com a maternidade. A despedida do lugar de filha.
O encontro com o bebê. A despedida do corpo grávido.
O encontro com o crescimento. A despedida da dependência total.
O encontro com o novo. A despedida do rotineiro.
O encontro com as brigas. A despedida do ideal de amor eterno amor.
O encontro com a voz. A despedida do silêncio.
O encontro com a dúvida. A despedida da certeza.
O encontro com o sofrimento. A despedida da satisfação.
O encontro para a despedida.
O encontro com o vento. A despedida de ficar em casa.
O encontro com o calor. A despedida do frio.
O encontro com uma história. A despedida de outra.
A espera, o recomeço.
Nota 1: Este texto foi imaginado a partir do meu encontro com um livro que eu ainda não conhecia, mas me encantei assim que o folheei numa livraria. E foi em momentos de espera, para novos encontros, que ele ganhou forma, depois de algumas despedidas.
Nota 2: Este texto, publicado pela primeira vez em 20/12/2013 no antigo blog Ninguém Cresce Sozinho, foi revisado e alterado minimamente em seu conteúdo original pela autora.
Imagens: Google.
Sobre a Patrícia L. Paione Grinfeld.