Dezembro é mês de “respirar” Papai Noel. Embora sua imagem esteja atrelada à mais importante celebração cristã e à data comemorativa de maior movimentação no mercado mundial de consumo, Papai Noel carrega uma universalidade encantadora: bondade, solidariedade, sentido de justiça, sabedoria dos mais velhos e a capacidade genuína de ouvir o desejo do outro.

Papai Noel escuta, mas também cobra. Com colo macio e barba de algodão doce, pergunta para cada criança que chega tímida ou totalmente à vontade, se estudou o ano todo, obedeceu à mamãe e ao papai, foi um menino ou menina legal. Suas perguntas não são um julgamento moral (como muitos adultos fazem), mas uma maneira de lembrar que o respeito está acima do desejo e que o presente é fruto de trocas. Papai Noel, sendo pai, é a voz da autoridade que sopra nos ouvidos lembrando que o sonho é ilimitado, mas a vida não.

Permitir a criança acreditar nesta figura não é incentivar o consumismo ou ser cúmplice de uma “mentira”, mas é autorizá-la a imaginar, sonhar e pensar. Através do mundo de fantasia a criança questiona “verdades” inerentes ao mito e à realidade – Como o Papai Noel consegue carregar tantos presentes? Como o Papai Noel entra em casa se não tem chaminé? Existe mais de um Papai Noel? Papai Noel usa aquela roupa todos os dias? A barba do Papai Noel é dele? Indagações desta natureza acontecem quando a criança começa a desconfiar sobre a existência real do bom velhinho, podendo levar alguns Natais até que ela descubra sua “verdadeira história”, em geral entre os 6-7 anos.

Se até os 9-10 anos a criança ainda acreditar que Papai Noel é real, deve-se avaliar se ela está tendo a chance de entrar em contato com o mundo de faz de conta (livros, filmes, brincadeiras) ou com a realidade. Muitas vezes, Papai Noel e outras figuras continuam reais como alternativa de manter vivo um pedacinho do mundo da imaginação que não conseguiu ser preenchido com outros recursos criativos, ou simplesmente porque recorremos à fantasia quando a realidade é/está dolorosa ou difícil. Por isso, o mais importante para a criança é poder transitar entre o mundo de fantasia e o real, sem priorizar um ao outro.

Quando irmãos, primos e amigos mais velhos tentam dizer aos menores que Papai Noel não existe, isto não deve ser motivo de preocupação. A criança só vai aceitar a realidade quando ela se questionar a este respeito. De qualquer modo, se a provocação inquieta todos, vale ter uma conversa em separado com quem a incita, lembrando-lhe como foi acreditar e depois descobrir a “verdade” sobre Papai Noel e outros personagens de faz de conta.

O mais importante no percurso indagatório da criança é não deixá-la sem resposta. Como quase todas as suas perguntas são formuladas com base em hipóteses investigativas, não podemos desperdiçar este campo fértil respondendo-a prontamente. Ao invés de servi-la com uma resposta fechada, pergunte-lhe o que ela imagina que é, acontece, significa. Desta maneira, estimulamos sua capacidade de construir pensamento, facilitando, assim, a ponte entre o mundo imaginário e a realidade.

Se, mais cedo ou mais tarde, todos nós conhecemos “a verdadeira história de Papai Noel”, por que crianças de todas as idades não perdem o encanto pelo bom velhinho?

Voltemos ao início. A magia de Papai Noel está na possibilidade sem fim de sonhar, imaginar, criar; está no desejo de ser olhado, acolhido e escutado, não como mais um, mas como único. Papai Noel personifica nossos anseios sem deixar de traçar limites. Em cada um de nós, ele silenciosamente mobiliza o que temos e o que procuramos. É por isso que ele encanta e continua existindo de uma forma muito particular para cada criança e cada adulto.

Diante de tantas injustiças e desrespeitos, é essencial existir alguém que “não se esquece de ninguém” e nos faz lembrar que em cada um de nós reside traços de bondade, solidariedade e justiça, que, se adormecidos, costumam acordar na época do Natal.

Então, por quê não deixar sua criança “acreditar” em Papai Noel? Com seus gestos brandos e poucas palavras, ele nos ensina muito mais do que Jingle Bells, no Natal ou sempre que ele se faz presente em nossa lembrança.

Nota: Este texto, publicado pela primeira vez em 04/12/2012 no antigo blog Ninguém Cresce Sozinho, foi revisado e alterado minimamente em seu conteúdo original pela autora.

Imagem: Google.

Sobre a Patrícia L. Paione Grinfeld.

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