As atividades extraescolares têm aproveitado, cada vez mais, a brecha deixada pela sobrecarga de tarefa dos pais e outros familiares, escassez de ajuda doméstica e falta de espaço público e segurança (só para citar alguns exemplos), e se transformado, por vezes, num grande negócio. Um negócio que vende a ideia de que a criança precisa, através de atividades específicas, estruturadas, programadas e mediadas, descobrir potencialidades, aprimorar habilidades e adquirir conhecimentos para estar mais preparada para enfrentar o mundo competitivo.

De fato, esses recursos são importantes, o que torna tais atividades bastante atraentes. Elas vão ao encontro da demanda de muitas famílias que buscam freneticamente suprir as carências da criança para que ela não fique em desvantagem. Um modelo perfeito no mundo dos negócios, mas delicado sob o ponto de vista emocional, especialmente no que tange às crianças pequenas.

Para não cair nas armadilhas do consumismo, precisamos, em primeiro lugar, lembrar que uma atividade extraescolar não pode, em hipótese alguma, ocupar o lugar da brincadeira e do descanso da criança. Através do brincar a criança expressa sua criatividade, elabora conflitos e aprende a lidar com a realidade (interna e externa). Através do brincar a criança descobre potencialidades, aprimora habilidades e adquire conhecimentos, o que nem sempre é conseguido por meio de atividades dirigidas, mesmo que elas tenham caráter lúdico ou recreativo. Isto porque nem sempre a atividade consegue atender à necessidade que a criança tem naquele momento.

Quando o tempo para brincar e descansar estão garantidos, pode-se pensar em uma (ou mais) atividade extraescolar. Contudo, antes de iniciá-la, é fundamental avaliar quem é que precisa de determinada atividade, a criança ou o(s) adulto(s) por ela responsável? Não é incomum pais (ou avós) quererem propiciar ao filho (ou neto) a oportunidade de fazer uma atividade que não puderam fazer na infância, ou uma que gostavam tanto (e às vezes ainda gostam), que imaginam que seu filho (ou neto) irá gostar também. Há situações em que um determinado hobby é “tradição de família” e os pais (ou avós) sentem-se na obrigação ou têm o desejo de perpetuá-lo, como a prática de algum esporte ou instrumento musical. Embora seja sempre interessante que pais e avós possam apresentar aos filhos e netos suas preferências e tradições familiares, é essencial que isso não se torne uma imposição sem sentido para a criança, anulando ou ignorando suas preferências.

Vemos, com bastante frequência também, pais que preferem que seus filhos se ocupem de atividades orientadas e/ou com pessoas que julgam ser mais capacitadas para estar com a criança do que cuidadores domésticos. Muitas vezes, atividades regradas demais, especialmente para crianças menores de seis anos, são difíceis de serem seguidas e professores podem ser menos habilidosos e carinhosos com a criança do que uma pessoa sem formação, mas que cuida bem e respeita o modo da criança se expressar através do brincar.

Como o interesse dos filhos nem sempre é o mesmo interesse dos pais e a necessidade de uma pessoa pode não ser a necessidade de outra, para que a atividade escolhida seja uma rica experiência para a criança, é importante:

1) Questionar quais os benefícios que a atividade poderá trazer à criança, levando em conta sua idade e personalidade. Algumas atividades não são indicadas para crianças muito pequenas (mesmo estando à venda no mercado infantil) porque exigem mais do que seu desenvolvimento físico e/ou emocional é capaz de responder. Por esta razão, é interessante avaliar alternativas que tragam benefícios similares para a criança – se o objetivo é uma atividade física para gastar energia, talvez uma quadra com outras crianças supra isto; se o objetivo é estar com outras crianças, uma opção é brincar com colegas da escola fora do período escolar, e assim por diante.

2) Averiguar o interesse da criança pela atividade. Ela viu/experimentou a atividade em algum lugar e quer conhecê-la melhor? Ela tem demonstrado interesse por algum assunto em especial, como pintura, que poderia justificar sua inscrição em aula de arte? Ou é um interesse dos pais, que querem introduzir o filho no mundo das artes, por exemplo? Nesse caso, como já apontado anteriormente, é importante observar se a criança também irá gostar da atividade.

3) Não fazer comparações – as crianças são diferentes umas das outras, têm ritmos, necessidades e interesses distintos. Não é porque os amigos da escola fazem determinada atividade que ela também tem que fazer. Uma criança que brinca em seu tempo livre e que não faz nenhuma atividade fora da escola não é uma criança pouco investida, desinteressada ou atrasada; ao contrário, é uma criança que consegue, através da brincadeira, suprir suas demandas físicas e afetivas (em alguns casos até mais do que uma criança que tem a agenda lotada sem tempo para brincar e descansar).

Precisamos lembrar que as atividades extraescolares carecem de um período de adaptação, o qual implica tanto a apropriação da criança pelo espaço, pessoas e ação, quanto o tempo que ela precisa para experimentar aquela atividade e ambiente para ver se gosta, lhe faz bem.

As atividades extraescolares podem trazer muitos benefícios para a criança e a família, mas pode ser um perigo quando ela acontece num momento e de uma maneira que não são os melhores para a criança. Assim, não basta escolher uma atividade extraescolar para a criança; é necessário acompanhar seu interesse e desempenho, sempre. Fazer por fazer não melhora a competência. O ganho só é obtido quando a experiência propiciada pela atividade casa com as demandas da própria criança, quando o olho dela brilha antes, durante e depois da aula, de satisfação.

Nota: Este texto, publicado pela primeira vez em 22/06/2012 no antigo blog Ninguém Cresce Sozinho, foi revisado e alterado minimamente em seu conteúdo original pela autora.

Imagem: Google.

Sobre a Patrícia L. Paione Grinfeld.