Uma criança que pergunta, quer resposta; resposta para aquilo que ela quer saber, entender, confirmar, se assegurar. Resposta que dê sentido às suas inquietações, sejam elas cognitivas e/ou afetivas. No entanto, diante de uma indagação infantil, é preciso estarmos atentos se nossa resposta corresponde ao que a criança perguntou ou àquilo que nós escutamos em sua interrogação.

Tomemos a versão legendada do curta-metragem, What’s Virgin Mean?, de Michael Davies, para ajudar nessa reflexão, uma vez que perguntas que apresentam ou sugerem conteúdo sobre a sexualidade são sempre emblemáticas para pensar sobre o descompasso corriqueiro entre o que é perguntado e o que é respondido.

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Numa cena cotidiana a filha pergunta à mãe o que é virgem. A mãe toma fôlego e, com uma explicação enorme, rebuscada e completamente sem nexo para aquilo que a menina lia na garrafa do azeite, responde de imediato e tudo à pergunta que ela escutou, mas que a criança não fez.

Se de um lado a resposta instantânea aponta para a prontidão e sugere a presença viva do adulto, de outro, ela fecha a possibilidade inaugurada pela criança de um diálogo, um encontro que permite a co-construção de um saber, e não o entupimento da criança com o saber do adulto. Do mesmo modo, tudo, pode sugerir a ideia de uma resposta completa, ao mesmo tempo em que não deixa brecha para o vazio, a falta, o surgimento da dúvida, da diferença e, o que é mais importante, do outro – no caso, a criança. Por mais que a menina lançasse novas perguntas, elas eram rapidamente incluídas no monólogo materno, deixando-a como mera expectadora do discurso da mãe.

Lembremos o enunciado do vídeo original no canal da Future Shorts: Sometimes little questions need big answers. Em livre tradução isto quer dizer: às vezes pequenas questões precisam de grandes respostas. Grandes, como sinônimo de grandiosas, claras; não longas ou excessivas. Respostas objetivas, e por vezes diretas, assim como são colocadas as perguntas na primeira infância – e não arbitrárias, como costumam ser as respostas dos adultos quando atravessadas quase que exclusivamente por suas próprias questões, conscientes ou não.

A criança quer ou precisa de resposta apenas para aquilo que ela pergunta. Não falar tudo não é omitir ou mentir. É falar o que a criança almeja saber, entender, confirmar, se assegurar e, sobretudo, aquilo que ela é capaz de apreender.

Se a criança pergunta para confirmar algo que ela já sabe ou foi informada, podemos devolver-lhe a pergunta. Se ela quer saber alguma coisa nova, um caminho é responder de maneira simples e sem rodeios, não introduzindo muitos elementos além daquilo que ela perguntou. Quando a resposta é insatisfatória ou provoca novas questões, a própria criança interroga o que foi dito com novas perguntas. Basta ter ouvidos para ouvi-las!

Seja qual for a situação, devemos levar em conta de onde a criança parte e o que ela já sabe sobre o que pergunta. Lançar um “onde você viu isso” ou algo similar ajuda a balizar qual caminho escolher para a resposta. Isso é escutar. Isso é o que permite o adulto acolher, confirmar, ponderar e ajudar a criança a construir e reconstruir cada uma de suas hipóteses, para que criança possa ir conhecendo e entendendo o mundo como ele é.

Ao escutar a criança não é apenas a criança que aprende (sobre o que o adulto tem a dizer). O adulto aprende sobre quem é essa criança. O ganho é bilateral, como esperamos que seja nas relações humanas.

Imagem: Google

Sobre a Patrícia L. Paione Grinfeld.

Para mais reflexões sobre este tema, participe da roda de conversas sexualidade na infância: do esperado a possíveis riscos, ou agende uma consulta de orientação a pais.