O processo de adaptação na escola é um período de múltiplas integrações: criança-família, criança-escola, família-escola, não se restringindo apenas às crianças que ingressam na vida escolar. As mudanças de escola, de ciclo, de turma, de professores e até mesmo do período de férias para o período de aulas também implicam numa adaptação ou, ao menos, numa readaptação à rotina, espaço e pessoas.

Através da inserção da criança no universo escolar, pais e filhos saem do conhecido meio familiar para um ambiente com caras e coisas às vezes bastante desconhecidas. De um lado, ganham novas possibilidades de relacionamento e aprendizagem; de outro, se deparam com certa dose de ansiedade, insegurança, incertezas e medos decorrentes da situação inédita.

Algumas crianças lidam muito bem com o que lhes é apresentado, nos primeiros dias ou em todos eles. Outras observam ao seu redor antes de experimentar o que lhes é oferecido, sozinhas ou com o apoio de alguém. Há aquelas que choram, gritam, esperneiam, emudecem, emburram, no meio de todos ou longe do buchicho. Existem crianças que adoecem, tamanho o estresse emocional. Tem as que grudam na mãe ou no pai e parecem que nunca, mas nunca mais, vão se desgrudar.

Do lado dos pais, as vivências também variam muito. Há os que se culpam em deixar o filho na escola para trabalhar; os que sentem alívio porque terão mais tempo para si mesmo ou para outras tarefas; os que experimentam um vazio enorme sem o filho do lado; os que mesmo sabendo que a escola tem uma equipe preparadíssima para cuidar de seu pequeno, morre de medo de não darem conta dele; os que dizem: “larga do meu pé!”; os que choram mais do que criança na hora da despedida, e muitos mais.

Cada pessoa é única e lida de modo muito particular com as mudanças, separações e novidades, de acordo com sua personalidade, maturidade emocional e momento de vida. Por isto, para garantir que a transição do ambiente familiar para o escolar transcorra da melhor maneira possível, é necessário:

1)   Estabelecer uma relação de confiança entre a escola e a família – mesmo que esta relação se estreite ao longo da convivência entre ambas, é fundamental que os pais se sintam seguros com a escolha da escola, que deve ir ao encontro do que eles esperam do ponto de vista pedagógico, ético e financeiro. Pais inseguros com sua escolha transmitem insegurança para o filho.

2)   Envolver a criança em seu ingresso na escola. Quando possível, levá-la para conhecer o ambiente escolar antes do início das aulas e deixá-la participar da aquisição dos materiais e uniforme, se houver. Explicar o que vai acontecer é fundamental para que a criança não seja pega de surpresa. No entanto, é importante tomar cuidado com os exageros e expectativas de como se imagina que a adaptação transcorrerá com a criança. Nem sempre ela acontece da forma imaginada.

3)   Cumprir com os combinados e pedidos feitos pela a escola (muitas escolas fazem reuniões de pais antes do início das aulas para explicarem sobre o período de adaptação) – horários, o que a criança pode ou não levar consigo, participação, local e tempo de permanência dos pais. Os combinados dão sustentação à rotina, o que é fundamental para que a criança comece a entender o funcionamento do ambiente, podendo, com isto, se sentir pertencendo ao novo meio.

4)   Pai ou mãe acompanhar a criança no processo de adaptação. Salvo situações muito particulares, que devem ser discutidas e acertadas com a escola, a adaptação na escola é tarefa dos pais (de um deles ou ambos, de acordo com o que foi acertado com a escola). Por mais que os pais tenham seus compromissos e a criança seja cuidada por terceiros, o processo de adaptação é um momento em que os responsáveis pela criança devem fazer a passagem do ambiente familiar para o escolar.

5)   Reservar na agenda um tempo mais longo do que o estipulado pela escola para o período de adaptação. Nunca sabemos como a criança reagirá. Mesmo iniciando o período de adaptação com desprendimento, a criança pode ter, ao longo do processo, comportamentos mais retraídos, precisando da presença de um dos pais por mais tempo. Isto em geral acontece depois que ela percebe que a escola não é mais um lugar de passeio, mas um lugar onde passará parte do dia longe das pessoas/lugares que está acostumada a conviver. Vale ressaltar que o mesmo pode acontecer após o período de férias ou algum período longo de separação entre a criança e seus pais.

6)  Evitar mudanças concomitantes com a fase de adaptação na escola: retirada de chupetafralda, mamadeira, paninho, troca de babá, residência, pequenas cirurgias, dietas, bem como manter rotina da criança em casa, evitando sobrecarregá-la com outras atividades. A escola, por si só, já é intensa o bastante.

7)   Só faltar às aulas se a criança estiver doente ou por motivos de força maior. Qualquer ruptura pode atrapalhar o processo de adaptação.

8)   Evitar fotos e filmagens, que tiram todos do seu foco – crianças porque são convidadas a olhar para os pais, e pais, que não se desligam das crianças, dificultado a separação.

9)   Não tecer comparações entre um filho e outro, entre um colega e outro. Cada criança é uma e por isto reage de maneira diferente diante de uma mesma situação.

10)  Se a criança tem irmão mais velho na escola, não lhe dar a responsabilidade de cuidar do mais novo. É importante que cada um tenha seu espaço assegurado, sem um peso que não lhe cabe.  Por isso é importante orientar o irmão mais velho a pedir ajuda para um adulto, caso o mais novo venha lhe solicitar. Isso não significa que irmãos não podem se encontrar e conviver na escola. Muitas vezes, levar a criança mais nova para ver o irmão mais velho em sua sala de aula ou atividade é uma estratégia que lhe confere uma referência familiar, o que pode lhe ser bastante confortador.

11)   Diante de qualquer pedido da criança, fazer a ponte entre ela e o professor ou responsável. Desta forma a criança se vê autorizada pelos pais a fazer o mesmo na sua ausência.

12)  Nunca sair da escola sem se despedir da criança. Diga-lhe para onde vai (sala de pais, trabalho, casa) e em que momento vão se reencontrar (na saída da escola, em casa).

13)  Ao deixar a criança na escola, despedir-se dela, dizendo quando irão se reencontrar (na saída da escola, em casa – neste caso reafirme quem irá busca-la). Se é uma criança de colo, ela deve ser entregue ao professor ou responsável, sem esperar que ele faça o movimento de “tirá-la” do colo em que ela está. Com isto evita-se que a criança sinta que está sendo “tirada” do pai/mãe. Se a criança já anda, ela deve chegar na escola andando e não no colo.

14)  Durante o período de adaptação, se possível, evitar rodízio de carona ou transporte escolar. A saída da escola é um importante momento para observar como a criança está e conversar com o professor. Se isto não for possível, deixar claro para a criança como será feito o transporte e apresentá-la ao responsável pelo transporte antes do início das aulas.

15)  Conversar com a criança como foi o dia na escola, deixando-a falar livremente. Caso não queira falar, não insistir, mas observar se há alguma mudança significativa de comportamento em casa.

O tempo que cada criança leva para se adaptar à escola e à nova rotina varia muito de criança para criança. Portanto, nesta fase cheia de surpresas, além do que foi exposto acima, é muito importante que os pais possam reconhecer seus próprios sentimentos diante da situação que está sendo vivida. Assim, terão muito mais condições de reconhecer e dar suporte aos sentimentos, demandas e dificuldades do filho. Uma adaptação benfeita evita readaptações e é uma porta aberta para o bom aproveitamento escolar.

Nota: Este texto, publicado pela primeira vez em 23/01/2013 no antigo blog Ninguém Cresce Sozinho, foi revisado e alterado minimamente em seu conteúdo original pela autora.

Imagem: Google.

Sobre a Patrícia L. Paione Grinfeld.

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